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Dia dos Avós

26.07.16

Li no blog da Sónia Morais Santos, Cocó na Fralda, e achei que diz exactamente aquilo que penso, a cada palavra, a cada frase. É tão isto:

 

"Os avós não são bem pessoas. São entidades. São património. Quando sabem sê-lo (porque é preciso vocação e talento, não se nasce a saber ser avó ou avô), são preciosidades na vida de todos nós. Amparam-nos, dão colo, brincam, têm paciência e tempo para nós. Tempo, sobretudo, que é algo que parece faltar a toda a gente. 

(...) É a magia da infância que os avós bebem com sofreguidão e retribuem com amor e bolos.

Tenho muita pena de quem não sabe dar valor aos avós. E ainda mais pena dos avós que não sabem dar valor ao estatuto a que chegaram, patamar único, pódio, prémio que a vida lhes dá."

 

Aquilo que sou hoje aos meus avós o devo. Foram dos melhores seres humanos que já conheci, entre as suas qualidades e defeitos (que também os tinham), eram pessoas extraordinárias. Foram eles que me criaram e que fizeram de mim a pessoa que sou hoje. Foram eles que me incutiram os valores que tenho e que hoje também tento passar aos meus filhos (às vezes lutando contra a sociedade em que vivemos e que distorce um bocado esses ditos valores), foram eles que me ensinaram que as pequenas coisas às vezes são tão mais importantes que as grandes. As dificuldades financeiras eram algumas, ainda assim não faltava o essencial. Foram eles que vi fazer enormes sacrifícios para me puderem educar, a vida foi-lhes mais madrasta que mãe. Pessoa humildes e de poucos estudos, mas não os comiam por parvos, isso é que não, e quando o tema era eu, viravam leões a defender a cria, enfrentando até as loucuras da minha mãe. Fizeram por mim o que ela não fez. Percalços da vida que agora não vêm ao caso. 

As manhãs eram a ouvir o "Despertar" da Renancença e quuando chegava da escola, ao almoço, era "religioso" ouvir os "Parodiantes de Lisboa". A minha avó adorava ouvi-los. Lembro-me com carinho dos passeios até ao "jardim dos baloiços" no Campo de Santana que também tinha a zona dos patos (levava-mos quase sempre pão para lhes dar, ou até ao Jardim do Torel onde havia as plantas (árvores será?) com os brincos de princesa que faziam as minhas delícias. Lembro-me de pensar que o Torel era enorme, visto da minha pequena dimensão, e de ficar a cada vez deslumbrada com a vista sobre Lisboa, sentia-me uma privilegiada, aquele jardim, aquela vista mesmo ali ao lado de casa. Lembro-me também das tardes passadas no Centro dos Idosos, onde o meu avô jogava às cartas e a minha avó fazia crochet e conversava com as outras senhoras. Eu acompanhava-os, a diretora concordou, pois não tinham onde me deixar. Ajudava as velhotas a desenrolar e enrolar as lãs

Lembro-me das férias do Inatel, na Foz de Arelho e do meu avô, nadador exímio, me levar nas costas dele a atravessar uma zona onde eu não tinha pé, só para a seguir brincarmos nas "piscinas" onde tinha pé até perder de vista. Nessas férias, dormia num beliche que dava para fazer cambalhotas pendurada na barra da cama de cima, não me cansava daquilo. O dia em que fiz seis anos estávamos precisamente lá, dei cambalhotas de contente, afinal já era crescida, ia para a escola primária no final do verão. 

No verão íamos à terra da minha avó, visitar os meus tios (irmãos dela) o que eu adorava aquilo, era o ponto alto das férias. Tinham os animais, as hortas, os pomares, caminhos sem fim para percorrer entre tropelias e brincadeiras com os primos. Comíamos a fruta apanhada das árvores na hora, íamos às amoras até firamos todos arranhados. A minha tia fazia pão aos Sábados de manhã, levantava-me com gosto às cinco da manhã só para a ver amassar e colocar os pães no forno. Com o resto da massa fazia a minha tia fazia uns pães pequeninos, chamava-lhes brindeirinhas, e quando acabavam de cozer ainda bem quentes colocava-lhes um fio de azeite, era um banquete para mim e os meus primos. Nunca voltei a comer pão saboroso como aquele, um dos sabores da infância que nunca irei esquecer. 

Tantas outras lembranças, o meu avô ou a minha avó, conforme era possível, irem-me levar à escola, tínhamos de atravessar por dentro do Hospital de S. José. Era uma animação ver as ambulâncias, inocência minha, afinal se ali estavam coisa boa não teria acontecido. 

Ir com a minha avó ao mercado do Forno Tijolo (nem sei se ainda existe), subíamos a R. do Intendente e outras ruas que não me recordo e era bem lá no cimo. A minha avó fazias as compras e eu trazia restinhos de legumes para brincar às cozinhas. Às vezes (quando o dinheirinho dava para tal) vínhamos ao Martim Moniz comprar tabletes de chocolate, na altura ali haviam vendedores de rua com chocolates, roupa entre outras coisas que não me lembro bem. Num voltei a comer chocolate tão bom como aquele. 

Tantas e tantas lembranças e tão boas. Fui uma criança feliz. Se calhar não dei aos meus avós o devido valor em devido tempo. A minha avó morreu nova e eu só tinha 15 anos, não reconhecia nada nem ninguém, demência, foram tempos difíceis. A saúde dela nunca foi grande coisa o que fez com que se reformasse por invalidez muito cedo. Depois dela morrer a minha relação com o meu avô que já era especial, ficou mais ainda. Tornámos-nos inseparáveis, cúmplices até mais não. E fomos assim até ele morrer. Ainda conheceu a minha filha, que feliz ficou de ser bisavô. Tinha um jeito tão atrapalhado de lhe pegar ao colo, era maravilhoso ver o ar ternurento dele para ela. 

Foram uns Avós e tanto!!! Que saudades imensas...

Dia dos Avós.jpg

(foto Martisses)

 

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